terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

MÍSTICA NUCLEAR

O homem é um ser místico. Esta assertiva já constitui um axioma, decorrente de um enigma palpável e irretorquível - A MORTE.
O Fenômeno da morte provocou, provoca e provocará no homem um impacto de catástrofe, enquanto ele não esvurmar todos os escaninhos do núcleo atômico e celular, desvendando os segredos do microcosmo.
O cataclismo da morte o deixou, o deixa, e o deixará sempre aturdido e desarvorado, à procura de uma explicação consoladora, que se ajuste à lei indeclinável da sobrevivência do indivíduo, a ânsia insopitável de eternidade. Discordo de Ernesto Renan e Max Müller, quando atribuem ao homem um instinto de crer. Acho que o instinto responsável pelo fenômeno místico é o instinto de sobrevivência, o desejo de permanecer vivo.
Quando a chama bruxuleante do raciocínio se acendeu no psiquismo do proto-homem e, através do primeiro comportamento místico, quer tenha sido feiticista ou naturista, conforme Augusto Comte; quer tenha sido animista, conforme Herbert Spencer e Taylor; quer tenha sido, ainda, totêmico, conforme Durkheim; ele encontrou uma possibilidade de continuísmo, um agasalho para o seu desespero. Desde então, tem percorrido múltiplos caminhos, guiado sempre pela imaginação e pela fantasia, construindo arranjos que até hoje nos extasiam, haja vista o politeísmo grego com sua mitologia, o Hinduísmo também com sua mitologia, o monoteísmo de Aknaton (AMENOTEP IV) e do Catolicismo, o Budismo e o Espiritismo. Inegavelmente, é soberbo e heróico, talvez patético, o esforço do homem, nessa procura incessante de sua origem e de seu destino.
Porém, o enigma permanece - a morte - e o axioma se impõe - o misticismo - e se acrescem de um novo impacto - a Ciência-.
Quando Lucrécio, no poema de Natura Rerum, expôs as teorias de Epicuro, Demócrito e Leucipo,
estava lançando as bases do método experimental, que seria a grande obra de Francis Bacon, no alvorecer do século XVII. Desde então, a experimentação e a contra-experimentação passaram a ser a base autêntica do conhecimento humano. As técnicas se aprimoraram e, no século XIX, Darwin enuncia a Teoria da Evolução, derrubando todos os totens e tabus que o medo da morte criara na fértil imaginação hominídea.
No entanto, uma sedimentação cultural ultramilenar - que se inserira profundamente na herança social e genética -, ao ver os seus ídolos pulverizados pela Ciência, sem que ela tivesse posto nada em seu lugar, a não ser o próprio Nada, caiu em desalento.
A Ciência dizimou as planícies do Nirvana, do Walhalla, do Éden e de todos os paraísos. Fez a Maiêutica, decantada por Sócrates, a incineração de todos os totens e tabus que povoavam o pensamento místico. Mas não ocupou o terreno conquistado e o terreno psíquico é do tipo que não pode ficar vazio, ou a loucura se encarrega de ocupá-lo. Talvez Augusto Comte não estivesse tão senil, quando propôs a sua Religião da Humanidade. Apenas não estava preparado. Mas pressentiu que o Positivismo seria a última pá de cal na Metafísica. E o lugar que ela ocupara durante tanto tempo não podia ficar vazio.
É preciso encher este espaço com uma nova mística, a MÍSTICA NUCLEAR. Uma mística que se arrime na Ciência e não em totens, tabus, dogmas ou abstrações.
O enigma da morte é o enigma da vida. Desvendar o mistério da vida é desvendar o mistério da morte.
O homem é um metazoário, somatório de trilhões de células - unidades anatômicas do ser vivo.
Ser vivo não é apenas o homem. A anatomia comparada, a psicologia comparada e a genética comparada, já provaram que o homem é o ápice da escala fito-zoológica, e o fenômeno vital, também ocorre nos unicelulares, com a mesma intensidade, talvez menos complexo.
A solução do enigma da vida não está na dissecação do HOMO Sapiens Sapiens. Porém, no anatomizar dos primeiros e rudimentares vagidos da vida. Na célula, no átomo, no núcleo dos dois, onde universos infinitamente pequenos escondem os tesouros e os segredos que assoberbam e alucinam os universos infinitamente grandes.
A Mística Nuclear tem por escopo a imortalidade aqui mesmo, cavalgando um táquion, de galáxia em galáxia, ou a imortalidade metafísica, como energia sutil que se inteirou ao sabor da evolução fito-zoológica e se conscientizou e se personalizou nas circunvoluções cerebrais do ser humano, - última etapa do evolver hidroprotéico-.
A morte, por enquanto, talvez seja a única porta capaz de libertar definitivamente a energia imarcescível, imponderável, do tegumento material que a comportou e permitiu a sua individualização para prosseguir na escala evolutiva, já, agora, ultradimensional, até o encontro com o Absoluto. Até a absorção no Todo.

EVANDRO CARREIRA
Manaus, Janeiro 1975

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